terça-feira, 27 de outubro de 2015

Brasil decime qué se siente...

A ideia da continuidade de um regime político por mais quatro anos, após permanecer doze no poder, sendo ameaçada, o que era impensável em prévias das eleições é só mais uma das semelhanças entre as tentativas do PT e do kirchnerismo de um quarto mandato. A insatisfação que levou votos para a oposição não difere muito entre Brasil e Argentina: mau desempenho econômico gerando elevação de taxas de desemprego, inflação, esquemas de corrupção e acusações de má gestão de recursos.

A aposta que elevou o Brasil a uma potência econômica durante o governo Lula e que tirou a Argentina da situação deplorável que se encontrava em 2001 foi uma aproximação com a China, especialmente na exportação de commodities. A desaceleração do crescimento chinês complicou a economia dos dois países, que haviam utilizado da expansão econômica para aumentar gastos do governo em detrimento de reinvestir os ganhos.

O resultado foi de um panorama ruim após o fim do boom, mas não para uma oposição até então enfraquecida por conta do sucesso das políticas de distribuição de renda. Antes das eleições, a maior discussão de quem analisava o pleito argentino era se o candidato governista, Daniel Scioli, conseguiria a quantidade de votos necessária para vencer ainda no primeiro turno, para tanto deveria alcançar no mínimo 45% destes, ou pelo menos 40% e uma margem de diferença maior do que 10 pontos porcentuais sobre o segundo colocado. No fim das contas, o candidato da oposição, Mauricio Macri, ficou com praticamente 2% a menos de votos do que o rival, levando as eleições mais acirradas da história da Argentina pós-ditadura para um segundo turno.

Até a morte de Eduardo Campos, que alçou Marina Silva a uma real chance de vencer as eleições presidenciais de 2014, Dilma Rousseff aparecia com uma larga vantagem nas pesquisas frente ao segundo colocado Aécio Neves. Em dados momentos, analistas desacreditaram totalmente nas possibilidades do opositor de se tornar presidente. No entanto, uma série de fatores como a evolução das denúncias de corrupção do governo petista e a campanha ferrenha de desconstrução de Marina por parte da situação, criaram um cenário que tornou o segundo turno das eleições o mais acirrado desde o retorno da democracia brasileira. Em algumas pesquisas, Aécio chegou a aparecer na frente de Dilma.

Os argumentos de desconstrução do adversário são parecidos entre os dois candidatos governistas. Frequentemente o nacionalismo é invocado para defender uma não aproximação com os Estados Unidos, proposta pelos opositores. O apelido de “candidato dos mercados” é usado tanto para denominar Aécio quanto Macri. As críticas pessoais não são tão diferentes, sendo os dois considerados por alguns como “playboys”: o argentino é um empresário que já foi presidente do Boca Juniors, enquanto o brasileiro tinha as facilidades conseguidas por conta dos cargos de familiares muito lembradas. Até as esposas dos dois não foram de todo esquecidas.

O fator determinante são os cerca de 20% dos votos dos terceiros colocados. Apesar do apoio declarado por Marina Silva, Aécio não conseguiu capitar a parte necessária deste eleitorado e acabou derrotado no segundo turno. Na Argentina, Sergio Massa detém essa parcela dos eleitores que será fundamental tanto para Scioli quanto para Macri.

Scioli é governador da província de Buenos Aires, onde os kirchneristas perderam boa parte dos cargos na eleição de domingo. Isso pode contar a favor de Macri, prefeito da capital argentina. Mas fazer previsões para o pleito do dia 22 de novembro em um cenário que surpreendeu tanto é complicado.

Gostaria de destacar quatro vitórias da democracia argentina: foi realizado para estas eleições o primeiro debate televisivo entre os presidenciáveis desde a redemocratização, ainda que sem Scioli, que já anunciou que participará contra Macri no segundo turno. A realização de um segundo turno já é uma boa amostra de que a pluralidade de pensamentos está mais presente na política. Além disso, um dos principais temores quanto a essas eleições não passou nem perto de ser um destaque: as fraudes eleitorais, infelizmente comuns por conta da utilização de cédulas. E por fim, parece que depois de muito tempo é possível falar da política hermana sem citar Perón.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Como seriam os países mais ricos do mundo no Brasileirão?


É óbvio que o que vou tentar fazer aqui é impossível de ser algo exato e levado como uma verdade incontestável, por um motivo muito simples: futebol não é geopolítica, muito menos economia e os times brasileiros são bons exemplos disso. Ainda assim, acredito que esse tipo de comparação tende a ser válida para tornar termos complexos mais palpáveis ao cotidiano. O que estará em questão aqui é a avaliação dos mercados para as 20 maiores economias do mundo nos últimos anos, sem necessariamente levar em conta o tamanho do PIB ou a importância do país.

O Brasil seria como o Fluminense, fez algumas escolhas controversas, com aviso prévio de boa parte da mídia. Essas acabaram criando conflitos internos, culminando em resultados ruins que só acirraram os ânimos de todos e geraram ainda mais desconfiança. Seria um time de meio de tabela caso não fosse a apresentação de um relatório deficitário nas contas públicas, e como muitos sonham no futebol, o mercado acabou agindo como um fair play financeiro, tirando boa parte da confiança no Brasil e colocando o país próximo da zona de rebaixamento. Os dois tem um problema claro de estrutura, já que o Fluminense não tem uma defesa confiável desde quando Thiago Silva era do clube, e o Brasil, apesar do crescimento, nunca fez os investimentos necessários em infraestrutura, o que nesses tempos de crise se mostrou um grande equívoco. A situação é muito ruim, mas vale lembrar que ainda se trata da elite econômica global e que já superamos adversidades maiores, não vamos sequer precisar de viradas de mesa. E claro, assim como no Brasileirão que tem o Vasco, há gente pior.

Um líder falastrão autoritário, que gosta de se meter onde não tem mais como apitar tem muitos anos. Putin ou Eurico, o fato é que a semelhança entre as duas figuras ajudou a colocar tanto a Rússia como o Vasco no fundo do poço. Soma-se a isso a extrema dependência de peças que há alguns anos renderiam bastante, mas que não estão bem hoje em dia, como Dagoberto, Guiñazu, petróleo e gás natural.

Com constância no topo e ótimos resultados nos últimos anos, a China seria o Corinthians. O fato dos dois serem tão importantes e estarem bem faz com que qualquer crise, seja uma queda na bolsa ou um resultado ruim fora de casa, tenha enorme repercussão e já coloque em cheque todo o êxito dos últimos anos. Ainda assim segue no topo, mesmo com os alardes na imprensa.

O Flamengo seria a Índia. Enorme, mas normalmente com uma administração confusa, às vezes se acerta e consegue grandes resultados que animam a todos, especialmente a mídia. Os resultados econômicos indianos já viraram rotina em publicações como a The Economist e a figura do atual primeiro ministro, Narendra Modi, já é tão comum nestes espaços como a de Paolo Guerrero nos tabloides cariocas. O topo do mundo ou o hepta sempre são logo ali, mas às vezes tem problemas no caminho.

Inter e México fizeram grandes investimentos, apareceram muito bem na imprensa, no entanto velhos problemas acabaram complicando o seguimento dos dois. Em um caso, o fato de deixar o Brasileirão de lado, que já não ganha desde 1979, e o excesso de medalhões rendendo pouco. No outro, corrupção e narcotráfico, problemas tipicamente latinos.

A maior potência no cenário internacional não vive grandes momentos desde 2008, alternando fases ruins e estabilidade, mas sem ser o protagonista de outrora. A economia dos EUA se recupera a passos lentos, enquanto o São Paulo faz bons jogos no campeonato brasileiro. Os dois tem um problema que parece latente e nunca se saem bem, no caso dos americanos, o complexo Oriente Médio, já para os são paulinos a Copa do Brasil, que as últimas eliminações: Bragantino, Coritiba e Avaí, fazem parecer a competição mais complicada que conflitos sectários.

Tanto o Palmeiras quanto a União Europeia já foram bem mais imponentes no passado, no entanto de uns tempos para cá, decisões equivocadas acabaram atrapalhando ambos e enormes crises se instalaram. A medida encontrada foi a austeridade, que por momentos criou graves problemas, como no quase rebaixamento do Verdão no ano passado, ou o caos que se instaurou em economias mais frágeis, o que é evidente no caso grego. Ainda assim, parece que as coisas se estabilizaram, a Europa voltou a crescer a passos curtos, e o Palmeiras faz boa campanha no Brasileirão brigando pelo G4. E um aviso aos europeus, a extrema-esquerda contra a austeridade do Syriza e do Podemos não são nenhum Gabriel Jesus, ou seja, um achado raro que vai ajudar as coisas a se resolverem mais rápido.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

A humanidade em uma lente

Na medida em que você ouve e lê relatos sobre as atrocidades da humanidade, esses parecem cada vez mais perderem a capacidade de comover e nos fazer lembrar de que aquilo se trata de outros seres humanos. Uma frase creditada a Stálin diz que “Uma única morte é uma tragédia, um milhão de mortes é uma estatística”, e ilustra bem isso. Recentemente li um dos livros que considero entre os mais difíceis da minha vida, “Gostaríamos de informa-lhe de que amanhã seremos mortos com nossas famílias” trata do genocídio de Ruanda e relata como vizinhos de uma hora para outra passaram a matar famílias inteiras com facões simplesmente por uma suposta diferença entre etnias. Não consegui ler dois capítulos seguidos sem uma longa pausa para lamentar.

Outra obra que tive acesso há pouco, “A Civilização do Espetáculo”, do Nobel Mario Vargas Llosa, trata exatamente da diferença que as imagens têm de nos mobilizar em comparação aos outros meios. Nestes últimos tempos eu já havia ouvido e lido sobre as maiores barbaridades cometidas pelos três lados da Guerra da Síria, ficado chocado com o número estimado de mortos no ano passado, mais de 70 mil, no entanto a foto do menino morto na praia, tentando fugir dos horrores que lutamos para entender, teve um impacto sem precedentes.

Não sei se a comoção pelo caso se dá pelo fato de praticamente todos nós conhecermos, e termos enorme carinho, com alguma criança de idade parecida, ou meramente pelo tão perturbante e surreal que é aquela imagem. A questão é que o drama dos refugiados e o desastre na Síria tomaram outra esfera de mobilização depois do caso. O problema disso, que é o endossado na obra de Llosa, é que a mesma capacidade que uma foto tem de comover, ela pode ter para alienar sobre o seu real significado.

O que ocorreu naquela praia turca foi um reflexo de um drama vivido por milhares de pessoas em um país devastado por uma guerra, que cabe a nós refletirmos, interessa a quem? A outra parte da história são as péssimas condições que os refugiados enfrentam para tentarem parar de lutar pela sobrevivência e passarem a ter uma vida. O impacto que uma imagem como essa tem em nossos instintos é perigoso, já que vale lembrar que a revolta gerada pelos vídeos do 11 de setembro acabaram dando embasamento para a invasão do Iraque, uma operação desastrosa que tem inclusive como consequência a atual Guerra na Síria que vitimou o pobre menino. A falta de racionalidade em uma situação como esta, pode acabar levando a adoção de medidas equivocadas, em um momento que apesar das enormes dificuldades, Irã, EUA e Rússia parecem estar concordando em uma estratégia comum, o que seria um grande passo para o fim da catástrofe.

Enquanto isso na Europa, não podemos nos esquecer da quantidade enorme de movimentos xenófobos, que inclusive vêm se refletindo na política. A Suécia, famosa pelo bom trato aqueles que precisam de ajuda, elegeu recentemente para cargos legislativos políticos de ideologia próximas ao neonazismo. Na França, o berço dos atuais princípios democráticos, quem lidera as pesquisas para as eleições do próximo ano é Marine Le Pen, da Frente Nacional, famosa pelas tentativas de combate aos imigrantes. Seu pai, Jean-Merie Le Pen, fundador do partido, chegou a declarar que o “Sr. Ebola” seria a solução para os problemas relativos à migração, em uma frase indigna de ser comentada.

A reação frente a uma imagem como aquela, tende a não ser das mais fáceis. O El País decidiu sequer publicar a imagem, enquanto outros veículos de igual prestígio quiseram demonstrar o drama que a foto representa. Chorar, se indignar, ou qualquer outra coisa nesse sentido é absolutamente comum. Mas não devemos nos esquecer de tentar buscar as soluções para que nunca mais tenhamos de nos deparar com uma imagem como esta e lembrar que lágrimas não servem apenas para lubrificar os olhos.


Descanse em paz Aylan Kurdi.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Dilma no Divã

Vejo sintomas na personalidade de Dilma que podem ter ajudado a colocar o Brasil na profunda crise atual. O motivo é que apesar de discordar em quase tudo da presidente, vejo grandes semelhanças no modo de agir dela com o meu.
Dilma é economista formada na Unicamp, graduação famosa no Brasil pelo viés de esquerda keynesiana. Eu me recuso a acreditar que durante seu primeiro mandato, Dilma não foi avisada das grandes implicações que a manutenção da política econômica brasileira em meio a uma projeção de dificuldades no cenário internacional, faziam com que a continuidade de elevados gastos sociais sem reinvestimento em infraestrutura pudesse colocar o Brasil onde está. Acredito que a presidente deva ter ouvido os avisos, agradecido por estes, no entanto dito que havia sido eleita com as propostas de não cortar benefícios sociais, e que daria a última palavra, por conta de seu cargo. Deu no que deu.
Se Dilma fosse uma ministra da Fazenda que tivesse dado os avisos e estes tivessem sido dispensados pelo presidente, acredito que ela teria simplesmente feito um ultimato, dizendo que não colocaria seu nome em risco por conta de uma política que não era aquela com a qual ela concordava. A postura se repetiu na articulação política, com a enxurrada de ministros que foram demitidos por Dilma no começo do seu primeiro mandato, o que certamente estremeceu sua relação com a base aliada que hoje em dia é sua maior inimiga. Sem dúvida, houve aviso.
Dilma fez seu mandato de 2011 até as eleições de 2014. Com o país em crise e sua popularidade em baixa, a presidente viu que para manter o poder deveria começar a compor um governo, e óbvio, não gostou disso. Para uma economista ver sua política econômica aplicada durante quatro anos levar o país à ruína, e depois ter que chamar um liberal com uma visão completamente diferente da sua para dar uma guinada totalmente oposta no país, não é fácil.
O mesmo vale para a articulação política, que ficou com o vice Michel Temer, praticamente decretando a soberania do PMDB no poder. A presidente de certa forma terceirizou seu mandato, delegando a economia e a composição do governo a duas visões diferentes da sua e parece que dificilmente vai mudar isso. O resultado é a apatia de Dilma, que parece simplesmente querer a chegada de janeiro de 2019 logo, com o menor número possível de bobagens ditas em seus discursos, e finalmente descansar tranquila deixando picuinhas e ofensas de lado. A lista de interessados pela posição é grande e não quer de forma alguma esperar até as eleições de 2018.
Em uma comparação esdrúxula, mas acho que motivada pelo mesmo fim, acredito que Dilma, assim como eu, detestava trabalho em grupo na escola ou na faculdade. Ela só devia aceitar duas maneiras para fazer tal: ou escolhia e mandava em tudo, independente do que qualquer colega falasse, como seu primeiro mandato; ou simplesmente ficava de lado, sem participar de nada, apenas ouvindo e torcendo para tudo aquilo acabar logo e enfim ela poder tomar uma cerveja no Sebá, assim como seu segundo governo. Talvez a parte do Sebá não seja coisa exatamente da Dilma, mas dá no mesmo.
A questão é a seguinte: há um governo. Ele é composto por deputados, senadores, ministros e boa parte das pessoas mais competentes de um país para fazê-lo funcionar da melhor maneira possível. O líder disso tudo deve saber ouvir e tomar a melhor decisão possível, depois de intensas discussões para saber qual é esta. Eu quero ser um jornalista, não um político, exatamente por saber que eu não sei fazer isso. Se cinco anos atrás alguém também tivesse tomado essa decisão, provavelmente estaríamos bem melhores.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

O Prêmio das Delações

É bem complicado falar sobre a política de um país em que o resultado de uma investigação tem mais impacto do que as próprias peças do cenário. Soma-se a isso a clara divisão criada no país desde as eleições do ano passado em que comentários um pouco mais críticos ao governo podem levar a uma sentença de golpismo e em contrapartida um elogio já é quase uma nota fiscal para demonstrar que você foi comprado pela situação. Se alguém ainda não percebeu isso, faça o seguinte exercício: abra uma notícia sobre política de um jornal estrangeiro e leia os comentários. Há discussões e argumentos e poucas vezes vi Angela Merkel ser chamada de vaca ou Isaac Herzog ser acusado de golpista.
Claro que o cenário de crise política deriva em grande parte dos fracassos econômicos recentes do Brasil e que enquanto inflação e desemprego estavam controlados, os nomes do vice, do presidente da câmara e do ministro da Fazenda sequer eram de fato conhecidos pela maioria. A partir do momento que uma eleição termina com a oposição fortalecida e o mais alto escalão do governo sob suspeita em uma investigação, o cenário se faz perfeito para a disputa pelo poder.
O PMDB soube explorar isso muito bem, exemplo foi a articulação política ter ficado com Michel Temer com menos de seis meses de novo governo. Uma movimentação que deixou claro que desta vez o partido seria protagonista. A presidência da câmara foi a grande vitória do PMDB que se aliou a oposição e se impôs sobre um governo enfraquecido e que tinha cada vez menos apoio. Medidas de grande apelo popular, junto a uma enorme quantidade de votações que dão a impressão de que a câmara está de fato trabalhando, levaram a Eduardo Cunha uma popularidade alcançada poucas vezes por alguém em seu cargo na história do Brasil. Junto a isso, a alcunha de primeiro-ministro, que se fez cada vez mais verdadeira com a apatia da presidente, o que levou a até comparações desta com a Rainha da Inglaterra.
Tudo indicava que Cunha só esperava o momento certo para romper de vez com o governo, e com sua enorme base de apoio, de fato se consolidar como a principal força política do país, dominando a câmara enquanto a presidente ficava com uma aprovação abaixo dos 10%. Eis que uma delação colocou o político em uma situação complicada, com indícios de que teria recebido 5 milhões de dólares nos esquemas que assolam o país. Cunha agiu rápido e rompendo sua ligação com o governo, conseguiu uma manchete que ofuscou a acusação. Ainda assim a perda de capital político foi enorme e boa parte dos quadros que o apoiavam incondicionalmente não vão querer ter seus nomes ligados a um caso de corrupção. É cedo para decretar seu fim político, ainda assim o primeiro-ministro de sucesso meteórico vai ter que segurar suas aspirações por um tempo.
Com o PT se desgastando cada vez mais, a alternativa para muitos políticos com medo de arranhar sua imagem foi atacar o partido, óbvio, criticando a corrupção e ganhando apoio popular. Marta Suplicy encabeçou o movimento e inclusive rompeu com o PT. Lula, visto como o Dom Sebastião brasileiro, na lenda o rei português que retornaria depois de anos para salvar o país, cada vez mais se distância do governo e já dá mostras de que pode se inspirar em José Mujica e criar uma Frente Ampla de esquerda. Tudo isso, claro, contando que os resultados das investigações permitam a carreira do Dom Sebastião tupiniquim, assim como seu estado de saúde.
O esgotamento do PT fragmentou o principal partido da oposição (a maior oposição é interna, sem dúvidas), o PSDB vê 2018 como momento ideal para vencer as eleições e evidentemente o quadro paulista liderado por Alckmin e Serra não está satisfeito com o candidato natural do partido, Aécio Neves para as eleições. A disputa interna pode dificultar a campanha do partido, assim como a participação de um candidato do PMDB, que é praticamente garantida.
30%. Segundo a agência de classificação de risco Eurasia, uma referência no mundo, essa é a chance de Dilma Rousseff não terminar o mandato. O número é muito alto principalmente levando em conta que ainda faltam mais de três anos para a presidente. A agência demorou muito para aumentar de 20% para 30% a possibilidade e há grandes indícios políticos de que a oposição, apesar de resistência interna, se movimente para um impeachment, e não, isso não tem nada com golpe. Todo este cenário depende do prosseguimento das investigações da Lava Jato e que CPI’s como a do BNDES não sejam abertas, já que estas podem tornar tudo ainda mais complicado para o governo.
Há chances para Dilma e o PT? Acredito que sim, apesar de vencer 2018 sem Lula ser praticamente impossível, uma recuperação econômica pode colocar o partido a ser de novo uma força importante, ainda que não para cargos majoritários. O rompimento de Eduardo Cunha junto às denúncias ao deputado pode ter sido a primeira boa notícia para os governistas em muito tempo. O fato é que 2018 está muito longe e quando o juiz Sérgio Moro passa a ser uma figura mais ativa politicamente que Dilma Rousseff e suas mandiocas, alguma coisa não está certa. A justiça tem seu preço.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

É a Economia, estúpido

O título é uma referência à campanha de Bill Clinton em 1992, que buscava mostrar que os problemas dos EUA no geral começavam com o mau momento econômico do país. No Brasil em 2014, excetuando aqueles que dizem não ver a crise e que vão achar tudo isso sem sentido, os problemas políticos não podem ser dissociados do difícil momento econômico que o país atravessa. Incompetência administrativa, gastos públicos excessivos e a corrupção aparecem como os principais vilões, mas há questões além dessas.
As dificuldades começaram a aparecer no meio do governo Dilma, um grande marco para entender como o desempenho econômico de um país é visto no estrangeiro são as referências a este na The Economist. Em meados daquele ano, uma capa da revista foi a do Cristo Redentor desgovernado no céu do Rio de Janeiro. Quatro anos antes, quando as medidas do governo viviam seu auge e como Lula disse, a crise financeira mundial havia atingido o Brasil apenas como uma “marolinha”, a capa da mesma revista era a mesma estátua, decolando. O interessante é que as mesmas apostas que salvaram o Brasil do momento delicado em 2008 nos colocaram neste.
Externamente o PT aplicou uma ousada aproximação com a China e um consequente distanciamento dos EUA, tradicional parceiro. A isso, somou-se a união entre os vizinhos que faziam parte do MERCOSUL, e que assim como o Brasil, possuíam uma estratégia de distância dos ianques. A estratégia deu certo durante o auge do crescimento chinês, salvou a Argentina da enorme crise de 2001, levou grande desenvolvimento social a Venezuela e Brasil e ajudou Paraguai e Uruguai. Vender principalmente commodities à China para sustentar sua invejável infraestrutura se mostrou um grande negócio. O problema é que os governos de imenso apelo populista não reinvestiram dinheiro em infraestrutura por aqui, deixando seus países altamente dependentes de vender matéria prima aos chineses.
Por outro lado no continente, Peru, Colômbia e Chile não deixaram de exportar para a China, ainda assim, sem o que ficou conhecido como “amarras do MERCOSUL”, estes países buscaram ampliar seu comércio, principalmente para o promissor mercado do Pacífico. Só para se ter uma ideia, o país que mais deve crescer este ano é Papua Nova-Guiné, com os assustadores 15%, sendo um bom representante do que investir nas economias pouco desenvolvidas dessa região do mundo pode render. Colômbia e Peru lideram com sobras o crescimento na América do Sul, com médias entorno de 4% de aumento no PIB nos últimos anos, enquanto vale lembrar que Brasil, Argentina e Venezuela beiram a recessão.
O ciclo de crescimento absurdo chinês começou a dar mostrar de estar saturado. Com a adesão da paupérrima Bolívia recentemente, o que restou no MERCOSUL para o Brasil foi uma Venezuela absolutamente arrasada pela baixa do petróleo, uma Argentina em grave crise, um Paraguai que sequer conta com saída para o mar. A melhor condição fica com o Uruguai, um país com uma população equivalente a da Grande Salvador e que não pode ser considerado um grande parceiro para sustentar a sétima economia do mundo.
Internamente, apostar em crédito fácil e concessões como a redução do IPI, resolveu em um primeiro momento. O Brasil não sofreu com o desemprego, as indústrias seguiram em um bom nível e o país não foi fortemente afetado. O problema é que não dá para apostar para sempre que a população seguirá comprando carros e os chamados eletrodomésticos da linha branca todos os anos, o que acarreta que em um momento de desconfiança como este, as compras começam a cair, o resultado é crise no setor e o enorme número de demissões a que assistimos diariamente.
Altas da taxa de juros e do dólar são dois dos principais remédios para o problema. Apesar de poder atrapalhar planos em curto prazo, é graças à desvalorização do real que não temos nem chances de virar uma Grécia. O fato da moeda grega não poder ficar mais barata, e, portanto as exportações ficarem mais competitivas, sem aprovação da Zona do Euro talvez tenha sido o grande vilão do atual momento grego. Os juros ajudam a atrair investimento estrangeiro, e usando o parâmetro dos principais veículos internacionais do assunto, o Financial Times e a The Economist, parece que o Brasil vai retomando a confiança. No começo do ano, o FT chegou a inclusive a publicar um artigo que listava dez motivos pelos quais Dilma não terminaria o mandato. Os elogios a Joaquim Levy, chamado de “Chicago Boy” por conta de sua formação acadêmica também são frequentes nas publicações.
A medida é difícil de aceitar, mas tem de ser a austeridade. Voltando ao começo do texto, realmente há enormes gastos no governo e só o corte de muitos podem colocar o país na reta do crescimento e trazer de volta a confiança internacional. O problema são os desdobramentos políticos disso e o que ainda não veio à tona. Assunto para logo.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

O Estado Islâmico pode ajudar a resolver a Questão Palestina?

O fenômeno político recente, que divide a Palestina, deixou este conflito tão complexo ainda mais complicado e com uma resolução parecendo cada vez mais longe. Desde a escalada de violência no começo dos anos 2000 e a morte de Yasser Arafat, líder da Autoridade Nacional Palestina, em 2004, palestinos passaram a se dividir na disputa pelo poder.
O resultado de diversos conflitos internos foi um grupo considerado pelo Ocidente como terrorista, o Hamas, assumindo o controle na Faixa de Gaza, enquanto a chefia da Cisjordânia ficou com a ANP sob o comando de Mahmoud Abbas. A instituição é reconhecida internacionalmente como a representante dos interesses palestinos, cabendo a Abbas a máxima responsabilidade pelas negociações de paz com os israelenses. Já o Hamas é visto como um grupo terrorista por Israel e desde que assumiu o poder na Faixa de Gaza, em 2006, se envolveu em duas guerras com o país, a última no meio do ano passado.
O grupo tem uma ideologia islâmica, e desde a sua fundação é adepto do tudo ou nada para os palestinos, ou seja, uma luta até o fim de Israel e a retomada completa do lugar pelos árabes. A ANP negocia uma solução de dois estados, na qual Israel e Palestina coexistiriam dividindo Jerusalém como capital. Obviamente o crescimento do Hamas como representante dos palestinos deixou Israel mais longe das negociações para ceder seu território, o que pode mudar com o surgimento de adeptos do Estado Islâmico em Gaza.
Uma parte importante dos muçulmanos apoia a ideologia do Hamas, que é respaldada na Irmandade Muçulmana, maior e mais tradicional partido árabe, fundado em 1928 no Egito. Além disso, diversos governos têm boas relações com o Hamas, como Irã e Catar. No entanto a situação na Faixa de Gaza é caótica, com uma das maiores densidades demográficas do mundo e a maior taxa de desemprego do globo. Há uma grande parcela de jovens que se questionam o que o governo fez por eles, sendo ainda mais suscetíveis a ideias radicais do que iraquianos e sírios que gozavam, por incrível que pareça de condições melhores quando aderiram ao ISIS.
O ISIS não entrou oficialmente na Palestina, ainda assim diversas brigadas vem cometendo atentados ou contra oficiais do Hamas e da Jihad Islâmica, outro grupo importante, ou contra o Sul de Israel, e dizendo que fazem estes em nome da ideologia do Estado Islâmico, repreendida por praticamente todo muçulmano. O fato dos ataques terem origem em Gaza faz com que Israel culpe o Hamas por todos, já que o grupo tem responsabilidade pelo território.
O lado bom disso é que na tentativa de conter os radicais que atacam inclusive o próprio Hamas, o governo pode se tornar menos extremo, sendo mais tolerante inclusive a uma ajuda israelense. Do outro lado, Israel pode ver que o governo islâmico que sempre foi visto como a pior opção na Palestina, conta ainda com variações mais perigosas, já que a tendência de extremistas surgirem é enorme em condições difíceis como a vivida em Gaza. Desta maneira, quem sabe o ISIS não contribua para que, sendo um inimigo comum, dois adversários se aproximem.
Claro que há um risco. Se o ISIS realmente crescer na Palestina, Israel não medirá esforços para conter o ataque, o que seria péssimo para todos. Além disso, vale lembrar que o governo do Hamas tem graves problemas, como as dificuldades impostas a vida dos cristãos. Mas a alternativa, como verificamos em outras partes do Oriente Médio com a crucificação de seguidores do cristianismo, prova que pior do que está, fica sim.