“From
here to eternity” foi o bom título escolhido pela The Economist, para em uma pioneira matéria, tratar da atual
situação do maior campo de refugiados do mundo, Dadaab, no Quênia. A localidade
que conta com 350 mil pessoas, população maior que a da Islândia, é constituída
em sua grande maioria por pessoas fugindo da terrível guerra da Somália, que
devasta o país há décadas e não indica perspectivas de fim em um curto prazo.
Boa parte
dos somalis de Dadaab chegou em 1991, ano que marca um grande acirramento do
conflito no país e que deixou milhares de mortos, além de inúmeros refugiados.
Portanto, muitos dos 350 mil habitantes ou perdeu as posses na Somália,
assim como o contato com suas famílias, ou nasceu em um campo no Quênia, o que
lhes coloca em uma situação próxima a de apátridas, já que não tem os direitos
nem de um cidadão somali nem de um queniano. Na década passada, o drama vivido por
estas pessoas chegou a receber grande mobilização internacional, assim como o
de outros conflitos africanos como o do Sudão, no entanto, o foco na crise de
refugiados no Oriente Médio tirou boa parte da atenção para
estes dramas humanitários.
Em 2010
a renda per capita anual de um habitante de Dadaab era de 223 dólares, o
que dá menos de um dólar por dia, no entanto, com o auxílio da ACNUR, a agência da
ONU para refugiados e ONG’s, crianças eram alfabetizadas na medida do possível
e doentes eram atendidos. Depois que as atenções se voltaram para a crise do
Mediterrâneo, a renda anual passou a ser de 148 dólares, valor que torna
qualquer atividade, mesmo que as intenções sejam as melhores, muito mais
difícil. Um grande número de jovens devem crescer analfabetos, tornando as
perspectivas de uma vida melhor que a de Dadaab, ainda mais complicadas, além
dos muitos que terão graves consequências na saúde por conta da falta de
recursos mínimos.
Mas o
alarmista título da The Economist
foca em uma tragédia que pode ser ainda maior, e que passou a ser preocupação
de somalis e grupos de defesa de direitos humanos nos últimos dias. O governo
queniano quer fechar Dadaab. A medida deixaria centenas de milhares de pessoas
sem terem para onde ir, e como principal opção retornar a uma Somália, na qual
muitos são ameaçados de morte. Além dos que fugiram por conta das ameaças dos
grupos armados que disputam a guerra no país, há o restante que terá de enfrentar uma
nação destruída pelas décadas de conflito. Conflito no qual, o grupo terrorista
islâmico Al Shabab, afiliado local da Al Qaeda, ganha cada vez mais terreno, o
que consequentemente leva a uma intensificação dos bombardeios de drones
americanos que combatem os terroristas.
E é
justamente o Al Shabab a alegação do governo queniano para fechar o campo de
Dadaab. O Quênia, com uma das economias mais pujantes do continente africano,
sofreu recentemente dois grandes ataques dos terroristas, o que abalou
fortemente a confiança de habitantes e investidores. O primeiro destes
aconteceu em um shopping em Nairóbi em 2013, matando mais de 70 pessoas, e em
2015, uma universidade foi o alvo e levou 147 pessoas a óbito. Segundo o grupo,
os dois atacaram lugares que representam valores ocidentais contrários ao radical
Islã que eles dizem acreditar.
Para o
governo do Quênia, Dadaab seria abrigo de terroristas do Al Shabab, que
poderiam aproveitar do disfarce de meros refugiados para realizarem novos
ataques no território do país. A complexa acusação justificaria assim, o
fechamento do campo, em um dos maiores casos de punição coletiva da atualidade.
Assim se
chega ao título da matéria que inicia o texto. De Dadaab para onde? O destino
de muitos, em caso de fechamento, sem dúvidas será a eternidade. Caso nada seja
feito para impedir a ação, o do governo do Quênia também, como causador de uma
das maiores tragédias humanitárias de nossos tempos.
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