terça-feira, 14 de julho de 2015

Acordo para quem?

Enfim a paz chegou ao Oriente Médio? Não. Foi um erro histórico que tornou o mundo um lugar mais inseguro? Provavelmente não. Mas o acordo nuclear do G5+1 (Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha) com o Irã foi um dos maiores acontecimentos desde o fim da Guerra Fria.
Primeiro pelas opções sugeridas ao invés dele: mais sanções ao Irã ou uma intervenção militar. A segunda provavelmente iria causar a maior guerra do mundo desde as duas grandes, tornaria o Oriente Médio um completo caos, atacando um país riquíssimo com quase 80 milhões de habitantes. A humanidade já deu grandes lições de sua estupidez , mas essa ainda assim surpreenderia. A outra dificilmente impediria a fabricação de armamento nuclear pelo Irã e apenas dificultaria ainda mais a vida de sua população, além de não aumentar a oferta de petróleo. Cada um escolhe o que acha pior.
Quem não gostou do acordo, que torna o mundo um lugar mais seguro por pelo menos dez anos, foram os países árabes sunitas, liderados pela Arábia Saudita, além de Israel. A resolução era o principal tema da campanha do primeiro ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que usou o medo da sua população de um vizinho que sequer reconhece Israel como país desenvolver armas nucleares. Apesar das estratégias propostas por ele serem absurdas, como a intervenção militar no Irã, somadas a uma postura israelense hipócrita, já que o país desenvolveu secretamente armas nucleares, Netanyahu usou bem eleitoralmente o temor de sua população e conseguiu se reeleger. E fez isso mesmo com uma das piores avaliações externas de um primeiro ministro israelense na história. Sem dúvidas ele e seu Likud não gostaram do acordo.
O outro lado é mais complicado e pode sim ser o principal ponto de discussão sobre o quanto o acerto é positivo. O mundo ficou mais seguro, já o Oriente Médio em futuro próximo talvez não, mesmo que o Irã não tenha condições de fabricar os armamentos. O regime iraniano dos aiatolás já influencia pelo menos cinco países com populações xiitas. Líbano e Bahrein possuem uma estabilidade maior, fato que não ocorre nas disputas entre sunitas e xiitas pelo poder na Síria, Iêmen e Iraque. É difícil dizer se governos financiados pelo regime ditatorial saudita e seus aliados do golfo são melhores que os que agora terão mais dinheiro iraniano envolvido, com a retirada das sanções sobre o petróleo do país. O fato é que olhando para um espaço de tempo breve, estabilidade na região não deve ser um legado do acordo. Ainda assim, não ter um governo hostil por tanto tempo com armamento nuclear naquela região não pode ser visto como um retrocesso de paz.
Os dois grandes interessados no acordo foram o governo Obama e os próprios iranianos. Uma metáfora que ficou comum nos Estados Unidos comparava o acerto com o Irã à baleia Moby Dick. Obama sabia que apostar todas as suas fichas naquele acordo poderia afundar de vez o seu governo, criticado pela ineficiência. Vale lembrar que duas promessas de campanha, a retirada total de tropas do Afeganistão e o fechamento de Guantánamo ficaram bem longe de serem cumpridas.
Aparecia ali a grande oportunidade para salvar o legado de um presidente que chegou prometendo bastante, levou até um Nobel da Paz por isso, mas ficou bem aquém. As negociações começaram em 2013, quando os democratas ainda tinham maioria na Câmara e no Senado, e na medida em que a situação política começava a virar, inclusive com a perda das duas casas no ano passado, Obama passou a ter pressa. Se houver uma votação contrária ao acordo, ainda caberá o veto presidencial, que por conta do tipo de negociação feita, só pode ser retirado por dois terços do senado. Praticamente impossível. Se um republicano vencer no próximo ano, algo no mínimo difícil, este poderá até tentar invalidar o acordo, mas ainda seria uma tarefa muito complicada.
A pressa de Obama só ajudou o grande beneficiado com o acordo, o próprio Irã. Logo quando o presidente Rouhani fez o anúncio, já ressaltou que o poder de negociação dos iranianos foi formidável. A primeira proposta paralisaria os avanços nucleares do Irã nesta área por 25 anos e obrigaria o reconhecimento do Estado de Israel pelo regime. O final foi um acordo complicado, que diverge entre oito e dez anos de paralisações, mas nada em relação aos israelenses. 
Nas ruas de Teerã o anúncio foi comemorado como um título de futebol. A popularidade do governo que agora terá um grande incremento financeiro está muito alta. Vale lembrar que diferente de boa parte dos países árabes que têm boas relações com os EUA, mas suas populações odeiam os americanos, o governo do Irã vê americanos como inimigos, no entanto principalmente entre os jovens, os ianques são vistos com bons olhos.
É difícil prever se a aproximação se dará também em áreas como o combate ao ISIS, inimigo comum, mas é provável que após a guinada liberal no governo de Rouhani, o Irã melhore suas relações com o Ocidente.

E nós com isso? Bom, pela lei básica da oferta e da procura mais petróleo no mercado faria o preço da gasolina cair. Por outro lado estamos tratando de Oriente Médio e fazer previsões é mais difícil que desenvolver bombas nucleares. É possível que sauditas e aliados cortem a produção para aumentar o preço do combustível e terem ainda mais dinheiro para financiarem milícias na luta contra as xiitas? Sim. Mas vamos esquecer a gasolina dessa vez. Finalmente estamos mais seguros.

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