Semana
bastante agitada no cenário mundial: visita de Trump ao México, Erdogan
reforçando suas restrições à liberdade, protestos colossais na Venezuela, acordo de paz na Colômbia colocando fim a 52 anos de conflito, e claro, o
momento final do processo de impeachment de Dilma Rousseff. No meio desta
turbulência, uma viagem de 11 garotos da elite do Reino Unido
ter grande repercussão pode surpreender a muitos, mas é compreensível.
Primeiro
que o grupo visitou a Rússia para se encontrar com ninguém menos que Putin,
apontado por muitos como o homem mais poderoso do mundo e que vem de grandes
vitórias no xadrez da geopolítica. A reunião dos 11 jovens foi justamente para
tratar do assunto, o que logo leva a se querer entender quais as reais
intenções do presidente russo ao receber os abastados no Kremlin.
Os 11
são alunos de Eton, a principal escola do Reino Unido, e até hoje,
provavelmente a instituição de ensino mais elitista do mundo. Formados em Eton
são 19 primeiros-ministros da história do Reino Unido, de um total de 54, desde
1721. O homem que liderou os britânicos durante o Brexit, David Cameron, é um
destes 19, e com a derrota para os que pediam a saída junto à União Europeia,
se viu obrigado a renunciar a o cargo. O principal nome da liderança que pedia
o Brexit, era Boris Johnson, também formado em Eton e que nunca foi um grande
entusiasta da saída, mas via nela uma possibilidade de ascender dentro dos
conservadores e se tornar o vigésimo chefe de governo britânico formado na
instituição. Deu errado por uma série de jogadas internas, mas hoje Johnson
ocupa o cargo de Ministro das Relações Exteriores, nada desprezível no país que
já contou com o mais vasto império da história.
Bom, é
difícil duvidar que Putin não tenha aceitado o convite de se reunir com um dos futuros primeiros-ministros do país. Pelo mundo circulou a mensagem, dotada de ironia,
ou não, de que o presidente russo teria encontrado ali o vigésimo chefe de
governo britânico formado pela escola de elite, para daqui vinte e cinco anos, quando
Putin ainda estaria no poder (duvida?).
Enquanto
isso, com menos alarde para sua formação, uma universidade de Direito emplacava
seu décimo-terceiro presidente em um país que apesar das muitas divergências
sobre o número, teve 37 pessoas no cargo desde 1889. É Michel Temer, empossado
oficialmente como presidente do Brasil, e mais um dos formados pela Faculdade
do Largo do São Francisco da USP, a chamada SanFran.
Verdade
que os tempos são outros. Boa parte dos presidentes formados na SanFran
assumiram o cargo durante o período chamado da Política do Café-com-Leite,
quando oligarcas de São Paulo e Minas Gerais se revezavam no cargo. Do outro
lado do Atlântico, as elites britânicas não têm a mesma força, vide a
sensacional história de Sadiq Khan, o filho de motorista de ônibus paquistanês,
que derrotou Goldsmith, formado em Eton e herdeiro de uma fortuna forjada no
sistema bancário. Khan assumiu a prefeitura de Londres, o terceiro maior cargo
personalista da Europa Ocidental.
O
interessante é que sem o mesmo alarde, nem visitando Putin, a porcentagem de
formados na SanFran que ocuparam o cargo máximo do executivo de seu país, tem
um empate técnico quando comparada com Eton: 35% nos dois casos. Sendo mais
específico, 35,18% no caso da escola britânica e 35,13% na faculdade de
Direito. Ou seja, pelo menos nos números, a chance de um dos presidentes do
Brasil ter estudado na SanFran é a mesma de um britânico que frequentou Eton
assumir o posto máximo na Casa do Comuns.
A
questão é que no caso brasileiro, não há tanto alarde. A notícia de que Temer
era o décimo-terceiro presidente do país formado no Largo do São Francisco
repercutiu pouco além das chamadas Arcadas, como são conhecidas as estruturas
da faculdade. Por sua vez, existem diversos relatos sobre a influência de Eton
no Reino Unido, sendo algo sempre divulgado sobre alguém quando este tenha
ascendido no cenário britânico.
O ranço
de tanto elitismo foi fundamental na obra de George Orwell, que frequentou Eton
sem nunca se sentir ambientado, por seus pais não possuírem tantas posses
quanto os dos colegas. Neste momento há um grande debate na USP sobre a questão das
cotas raciais. É sonhar muito pensar que nosso Nobel de Literatura possa de um
cenário como este, mas fica a esperança. Já um dos próximos presidentes, é
quase certo. Fica de olho, Putin.
Já pensou voltar pra SanFran com uma selfie com "ele"? Foto: Getty Images
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