Em um
dos brilhantes episódios de Simpsons, infelizmente não me lembro qual, Homer
parecia em uma situação desfavorável, até que solta a seguinte frase:
"Você só não contava com uma coisa: a minha indiferença com a vida humana."
Isso serve bem para definir a volta das atenções à Al Qaeda depois do último ataque em um hotel no Mali.
Diversas
pessoas depois dos atentados de Paris desmereceram a capacidade da Al Qaeda em
detrimento do Daesh (ISIS). A questão é que quando se lida com gente que
acredita que não tem nada a perder, as análises não podem ser comuns como, por
exemplo, dizer que o Reino Unido não tem o mesmo poder de antes ou que a China
virou um grande ator global. Basta a oportunidade para um tipo de ação como a
atentado em Bamako, que matou 27 pessoas, que pronto, um grupo volta a ter
destaque.
É fato
que a Al Qaeda não é tão forte quanto na última década, quando além do 11 de
setembro, o grupo cometeu ainda grandes atentados em Londres, Madri (o maior da
Europa) e Bali. Ainda assim, com suas ramificações, consegue ser um ator
fundamental em pelo menos quatro grandes conflitos: Al Qaeda do Magreb Islâmico
no Mali, Al Qaeda da Península Arábica no Iêmen, Al-Shabab na Somália e Frente
Al Nusra na Síria. Além disso, há diversos grupos que já pelo menos declararam
se aliar aos ideais destes terroristas em muitos locais, como Afeganistão e
Filipinas.
O Mali
reúne praticamente todos os elementos perfeitos para a ascensão de uma ramificação
radical como a Al Qaeda. País paupérrimo é palco de grande instabilidade desde
a chamada Revolução Tuaregue em 2012, que foi sufocada com tropas francesas. Ou
seja, possui diversos jovens frustrados e indignados dispostos a morrer por uma causa
aparentemente justa. O ataque ao hotel visava matar estrangeiros, que nesse
tipo de situação, são vistos apenas como ocidentais e a nacionalidade de fato faz
pouca diferença.
O que
vale para a enfraquecida Al Qaeda, vale para a preocupação do momento, Daesh.
Ações contra estes grupos podem surtir efeitos importantes contra o terrorismo,
como vimos no caso da rede de Osama Bin Laden, que alguns chegaram até a pensar
que estivesse acabada. A intervenção na Síria e no Iraque provavelmente vai
diminuir muito o poder do Daesh, mas enquanto a ideia de jihadismo destes
terroristas não for derrotada, o cenário será apenas a morte de mais
jihadistas.
O
caminho para isso passa por uma discussão sobre quem de fato financia o
terrorismo pelo mundo, além de colocar em pauta a vertente wahabista do islã
que vem sendo exportada há anos pelo regime saudita e é a base de grande parte
dos grupos extremistas islâmicos. Mas estes são temas que uma hora ou outra vão ter de
ser abordados.
O foco é
que a análise de grupos extremistas não pode ser feita de maneira simples, já
que a grande arma destes normalmente é a total indiferença com a vida humana, o
que como estamos assistindo, pode ser mais valioso que um serviço de
inteligência de qualidade e um exército bem armado.